RJ-MG no rio Paraibuna

CAPÍTULO II

DIVISA RJ – MG no RIO PARAIBUNA

LINHA do CENTRO da E.F.D.P.II


 Relembrando o conceito, “Agencias de Divisa” são as criadas em território de um estado e temporariamente subordinadas à Diretoria Regional dos Correios de um estado vizinho. Ver definições na Introdução no menu principal [1].

Introdução histórica

A ligação entre a Corte e Ouro Preto tradicionalmente seguia a estrada que se iniciava em Paraty, subindo a serra e atavessando o vale do Paraíba paulista. Era conhecida por “Estrada Real”. Por volta de 1700, com o aumento do tráfego, o governo considerou construir um novo acesso que fosse mais curto e evitasse o inseguro trecho por mar.

O Caminho Novo

Para abrir o novo caminho, contratou-se Garcia Rodrigues Paes, que conhecia bem a região por ser filho do bandeirante Fernão Dias Paes Leme – o famoso Caçador de Esmeraldas. O trajeto escolhido partia de portos no fundo da baía de Guanabara, subia a serra passando pelo futuro local de Petropolis e descendo até Paraíba do Sul, um dos mais antigos curatos fluminenses e que posteriormente adotaria o nome do rio. Nesse local o caminho cruzava o rio e subia até encontrar o rio Paraibuna mais adiante – onde se construiu uma ponte para atravessá-lo e continuar para o interior de Minas. Esse trecho foi concluido em 1704 e ficou conhecido por “Caminho Novo”. É preciso dizer que essa rota já era conhecida pelos indígenas e pelos comerciantes.

A União e Indústria

Bem mais tarde, esse era o trajeto que D. Pedro I fazia a caminho de Minas. Encantando-se com a região, pensou em comprar terras e construir Petropolis – sonho que foi realizado em 1843 por D. Pedro II. Outra importante inciativa do Imperio foi a construção da primeira estrada calçada do Brasil, a União e Indústria, que ligava por uma linha de diligências Petrópolis a Juiz de Fora, inaugurada pelo imperador em 1861. Esta seguia em parte o traçado do Caminho Novo, descendo o rio Piabanha de Petropolis a Três Rios onde cruzava o Paraíba acompanhando o vale do seu afluente Paraibuna até Juiz de Fora.

A Estrada de Ferro Dom Pedro II

Outra importante inciativa imperial, a EFDP II tinha como objetivo a união nacional, ligando a Corte ao rio São Francisco. A ferrovia, vinda de Barra do Piraí, acompanhava o curso do Paraíba chegando a Três Rios em 1867, onde se bifurcava. Uma linha continuaria acompanhando o rio até Porto Novo e outra seguiria em 1874 para o norte acompanhando o rio Paraibuna. A linha permanece ativa atualmente para trens de carga.

O trecho é hoje acompanhado por uma autoestrada, a BR-040, Rodovia Washington Luis, cujo primeiro trecho, Rio-Petropolis, foi inaugurado em 1928 no mandato desse presidente. Ela liga o Rio a Brasilia, quase no mesmo traçado de séculos.

A divisa no rio Paraibuna

A divisa entre as provincias do Rio de Janeiro e Minas Gerais objeto deste capítulo é o trecho do rio Paraibuna entre sua foz no rio Paraíba e seu afluente rio Negro na margem direita. Até o final do império,  toda a margem direita desse trecho era parte do território de Paraíba do Sul. No início da república, a área foi incorporada ao município de Três Rios e, em 1991, ao novo município de Comendador Levy Gasparian.

O detalhe da Carta Geographica do RJ de 1823 mostra a bacia do rio Paraibuna objeto deste capítulo.  O trecho que nos interessa começa na foz com o rio Paraíba e acompanha seu leito até seu afluente rio Negro, que sai à esquerda na grande bifurcação e passa a ser a divisa com Minas Gerais até praticamente o estado de São Paulo (detalhado no próximo capítulo deste trabalho).

A parte superior da bifurcação mostra a continuação do leito do Paraibuna em território mineiro na direção de Juiz de Fora (que assinalei com um pequeno circulo azul na direção norte.

***

As rotas comerciais

Neste bloco, vou discorrer sobre os traçados das rotas comerciais originais que cruzaram a região objeto deste capítulo e criaram as bases para a criação dos postos fiscais (registros) e as futuras agencias postais. Detalhes sucessivos do mapa de 1823 com destaques em cor ilustrativos de cada rota (acrescentados por este autor) estão apresentados a seguir.

O Caminho Novo da  Estrada Real (1704)

Como vimos na introdução, em 1704 o Caminho Novo foi terminado e seu traçado está destacado em azul no mapa de 1823. Ele sai de porto na baía de Guanabara (em Magé, ao pé do mapa) e segue para o norte até encontrar o Paraibuna em cuja margem foi instalado em 1711 o Registro da Paraibuna, que também está marcado no mapa.

**

A Estrada União e Industria (1861)

Outra importante iniciativa do governo imperial foi a Estrada União e Indústria, primeira via calçada do Brasil.

O projeto foi lançado nos anos 1850, como se vê na imagem de uma ação da Companhia e a obra inaugurada pelo imperador em viagem de diligencia  em 23 de junho de1861.

Partindo de Petropolis, seu traçado, destacado em verde no mapa de 1823, seguia o rio Piabanha até sua foz em Três Rios e continuava pelo rio Paraibuna até Juiz de Fora. Muitas de suas estações de muda deram origem às estações da EFDP2 que veremos no próximo bloco.

 

**

A Estrada de Ferro D. Pedro II (1874)

Após subir a serra e atingir Barra do Piraí no rio Paraiba, a ferrovia acompanhava o leito deste chegando a Entre Rios (atual Três Rios) em 1867 (marquei o local com um minúsculo círculo azul). Neste ponto, a ferrovia se bifurcava. Um ramal seguia pelo rio Paraíba até Porto Novo e a linha central seguia para o norte pelo leito do Paraibuna chegando ao Registro em 1874 e a Juiz de Fora em 1875. Seu traçado está destacado em preto no mapa de 1823.

***

Os postos fiscais (registros)

Acompanhando as rotas comerciais, é compreensível o estabelecimento pelo governo imperial de postos fiscais em pontos específicos de controle para o recolhimento dos impostos sobre as mercadorias circulantes, como por exemplo o ouro de Minas Gerais e posteriormente o café das fazendas mineiras e fluminenses.

É dessa época o “Mappa das Recebedorias, Collectorias e Linhas de Correios (…) da Provincia de MG” pelo Engº Aroeira publicado em 1866, do qual extraí a região do Paraibuna. As bandeirolas verdes são as Recebedorias mineiras que, não por acaso, estão nos pontos de passagem das rotas comerciais.

O primeiro que temos notícia é o Registro da Ponte de Paraibuna, instalado às margens do rio em 1711 após a conclusão do Caminho Novo em 1704. Ele pode ser visto ao centro do detalhe do mapa. Penso ter sido a mais antiga na região e alem disso, nos demonstrativos que acessei até por volta de 1880, consta como o maior e mais importante dos registros nas divisas RJ – MG. Seu edificio original é também considerado o mais antigo ainda existente.

O mapa apresenta também dois outros registros junto ao Paraibuna: o Ponto do Avellar provavelmente na margem do Paraíba e próximo a Três Rios e o Gamelleira, próximo a Serraria no local que posteriormente foi atravessado pela EF União Mineira, e também consta como um dos dez maiores registros). Nenhum dos dois teve agencias postais.

 


As Agencias Postais “de Divisa” no rio Paraibuna


Os blocos anteriores servem como embasamento histórico para a localização das Agencias Postais no vale do rio Paraibuna, especialmente as “de Divisa”. Adotarei como guia inicial o mapa postal de 1888, já que ele registra as ferrovias e as agencias no estado do Rio de Janeiro.

A EF D.Pedro II chegou a Tres Rios em 1864 e retomou a Linha de Centro em 1874 na direção de Juiz de Fora. São duas as estações indicadas com agencia postal nesse trecho: Serraria e Paraibuna (a bandeirola com 3 listas indica a existência de uma agencia de 3ª classe).

 


SERRARIA


Uma imagem mais recente da estação já sem os trilhos (Fonte “O Trem Expresso”)

A EF D.Pedro II acompanhou o rio Paraiba até Tres Rios, quando tomou rumo norte até encontrar o rio Paraibuna, local em que foi construída uma ponte para o território mineiro e a partir daí seguir sua margem esquerda até Paraibuna.

Revista da Semana nº 627, maio de 1912

O detalhado mapa “Três Rios” do IBGE nos mostra a particular situação do povoado de Serraria na península e apresenta o rio Gameleira, afluente do Paraibuna em cuja confluência provavelmente se localizava o Registro (ou Recebedoria) Gamelleira. Isso porque há uma nota na imprensa que alerta sobre o risco que correrá sua sede pela construção da EFDPII.

O Wikimapia atual mostra com clareza a União Industria, a BR 040, a EFDPII, sua estação e,  principalmente,  o local original do povoado de Serraria em uma península em frente à qual desembocava o rio Gameleira que deu nome à fazenda e ao registro. Permite também projetar o traçado da EF União Mineira, fundada em 13 de junho de 1876, cuja estação inicial era também a estação Serraria e se dirigia a Santana do Deserto em MG.

***

 Os dois registros conhecidos na região são os de Serraria (Gameleira) e o de Paraibuna, que é o mais antigo, de 1711, decorrente da construção do Caminho Novo. Garcia Rodrigues Paes, seu construtor, foi agraciado com fazendas na margem fluminense do rio. Uma delas, a fazenda Serraria, foi mais tarde adquirida por Hilário Joaquim de Andrade, barão do Piabanha (1796-1865), político e filantropo fluminense, com forte presença em Serraria. Com todos esses dados, é razoável supor que o povoado de Serraria tenha sido importante entroncamento de rotas comerciais utilizadas durante o ciclo do ouro no século XVIII.

Datas


Estação de Serraria – Data de Inauguração da Estação (DIE): 20.09.1874

Nessa data foi inaugurado o trecho da EFDPII até a estação de Paraibuna com a presença do Ministro da Agricultura, Comercio e Obras Públicas a quem se reportavam também os Correios desde 1861. A data consta em nota no O Globo edição de 22 que também menciona a “sólida e elegante ponte da Serraria”.

Data de Criação da Agência (DCA) 06.09.1861 (RJ)

A data é a que consta em nota no Correio Mercantil RJ informando a nomeação do agente local. O ano de 1861 é confirmado pelo Relatório de Agencias do Império de 1885. Essa data faz sentido por coincidir com a da inauguração da estrada União e Indústria algumas semanas antes. É a mais antiga da região.

Data de Transferência da agencia para MG – 19.02.1891

É uma das poucas datas que temos certeza pela publicação no Boletim Postal da Portaria nº 67 de sua criação. Razão pela qual a reproduzi ao lado.

Foram 30 anos de existência desta “agencia de divisa”. Note-se que o colega mineiro Paula Sobrinho registra a DCA idêntica em seu verbete, o que confirma que seus dados informam, corretamente, a data da agencia operando oficialmente em Minas.

 


As Agencias Postais “de Divisa” na EF União Mineira


Confesso ter ficado em dúvida sobre tratar este assunto aqui, interrompendo a descrição “do rio Paraibuna”. Mas, por outro lado, a ferrovia tem sua origem e seu momento com a possibilidade de servir a zona da mata através de “um ramal” da EFDPII que seguisse o traçado da antiga rota comercial, utilizando a mesma estação de Serraria como inicial.

Assim, o Decreto Imperial nº 6471 de 18.01.1877 “Approva, com alterações, os Estatutos da Companhia União Mineira e a autoriza a funccionar”.

A partir de Serraria, a primeira estação a ser inaugurada, a 7 km de Serraria, foi a de Silveira Lobo, e 5 km mais adiante, a de Socego (ou Sossego). Ambas inauguradas a 13.05.1879. Os trabalhos continuavam e assim, em 07.07.1879 duas outras estações foram inauguradas, as de São Pedro (do Pequeri) e Santa Helena. Bicas foi a seguinte em 09.09.1880. Nesse ponto, houve uma pausa para estudos de engenharia e as obras recomeçaram no ano seguinte com as estações de Roça Grande inaugurada em 20.06.1880 e a de São João Nepomuceno em 24.