Carimbos CGC com letras

OS CARIMBOS “CORREIO GERAL DA CORTE” COM LETRAS NO DATADOR

Por Paulo Novaes*

Apresentação

Este estudo tem como foco uma série especial de carimbos com legenda “Correio Geral da Corte” que circulou na Corte nos anos 1860. Nessa série os carimbos possuem letras ao centro da cruz formada pelos numerais da data. Refiro-me especificamente ao tipo PA 1612 listado no catálogo de Paulo Ayres, cujo fac-símile apresento abaixo.

Note que o PA 1612 está representado com as letras “EM” ao centro do datador. No entanto, como veremos mais adiante, existem outras combinações de letras que não estão mencionadas no catálogo. Meu objetivo é listá-las, descrevê-las, interpretar o seu significado e estabelecer a sua origem. Para isso, será necessário primeiramente apresentar a estrutura organizacional dos Correios da Corte ao longo do tempo.

A organização do Serviço dos Correios do Império em 1844

O Regulamento de 21 de dezembro de 1844 [1] informa que o “Serviço dos Correios do Império” era chefiado pela Diretoria Geral do Correio – com cinco “Empregados” – à qual se reportava a Administração do Correio da Corte e da Província do Rio, chefiada por um Administrador.

Seu Art. 12º relacionava 31 “Empregados” reportando-se ao Administrador, mais os “Carteiros e Pedestres que forem necessários”. O Art. 13º dizia que “O Administrador é o chefe da Repartição do Correio do Município da Corte e em toda a Província do Rio de Janeiro, e como tal lhe são subordinados todos os Empregados e mais pessoas ocupadas no serviço do mesmo”.

Como se depreende, não há menção a uma estrutura organizacional formal.

O regulamento interno de 1849

Essa situação começaria a mudar na publicação do Regulamento Interno da Administração do Correio da Corte em 27 de setembro de 1849 [2]. Neste, já o Art. 1º do Capítulo I dizia “A Administração do Correio desta Corte constará, alem do Administrador e seu Ajudante, de cinco turmas: a 1ª será denominada turma da entrada da correspondência; a 2ª da saída; a 3ª da tarde; a 4ª da Contadoria a 5ª da Tesouraria”.

Foi assim a primeira vez em que os funcionários eram organizados em turmas de trabalho conforme a sua atribuição e seu horário de trabalho.

As alterações no regulamento interno de 1855

Algumas dessas disposições seriam alteradas no Regulamento Interno de 22 de dezembro de 1855 [3]. Seu Art. 1º dizia: “Os Empregados (…) serão divididos em quatro Turmas, a primeira encarregada da Importação, a segunda encarregada da Exportação, a terceira da Contadoria e a quarta da Tesouraria”. Cada uma destas divididas em duas Secções e, acrescentava o Art.7º, “Huma Secção da primeira e outra da segunda Turma farão o trabalho da manhã, e huma Secção da primeira e outra da segunda Turma farão o trabalho da tarde”.

O significado das letras

Chegamos finalmente ao objetivo deste estudo. A partir de 1855, pela primeira vez tínhamos oficialmente  a definição de turmas responsáveis pelos serviços operacionais de entrada (Importação) e saída (Exportação) da correspondência, ambas trabalhando em dois turnos (Manhã e Tarde). Seria muito natural que os carimbos por elas utilizados deixassem clara a responsabilidade pelo manuseio. Assim chegaríamos a quatro combinações possíveis na composição das equipes e, em decorrência, das letras em seus respectivos carimbos:

  • Tipo 6a – EM: (turma da) expedição, (turno da) manhã;
  • Tipo 6b – ET: expedição, tarde;
  • Tipo 6c – IM: importação, manhã;
  • Tipo 6d – IT: importação, tarde.

Esses tipos aparecem circulados de 1862 a 1864.

Uma variante são os tipos só com a indicação dos turnos:

  • Tipos 6e e 6f – M: turno da manhã; duas variantes por tipologia
  • Tipos 6g e 6h – T: turno da tarde; duas variantes por tipologia

Esses tipos aparecem circulados de 1864 a 1866.

Uma segunda variante apresenta pela primeira vez “Rio de Janeiro” ao invés de CGC na legenda superior, mudança essa que veio para ficar: assim seriam grafados todos os carimbos posteriores do Correio Central até 1889. Na legenda inferior, um florão.

  • Tipo 7a IM: legenda Rio de Janeiro
  • Tipo 7b IT: legenda Rio de Janeiro
  • Tipo 7c – sem letras no datador; leg. Rio de Janeiro

Datas de circulação 1866-67.

Tabelas de imagens e análise da tipologia

Nota: as duas tabelas abaixo apresentam subtipos com a mesma grafia, mas com tipologias distintas com famílias com e sem serifa (6e/f e 6g/h)

O quadro a seguir apresenta imagens dos tipos mencionados acima:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Nota: a coleção completa das imagens de documentos postais (de onde esses detalhes foram retirados) podem ser vistas no menu Correio Geral da Corte no menu principal. Clique aqui.


A evolução da estrutura organizacional – decretos de 1861 e 1865

Cito mais dois decretos por terem sido publicados durante a circulação dos “carimbos de letras” objeto deste estudo. O Decreto de 1861 [4] nos informa sobre a nova subordinação dos Correios à Secretaria de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, criada no ano anterior.

Os impactos ficariam mais explícitos no Decreto de 1865 [5]. Neste, é extinta a Administração dos Correios da Corte, fundida agora com a Diretoria Geral. Transcrevo o Art. 1º do Capítulo I:

A Diretoria Geral dos Correios é o centro de todas as ordens expedidas pelo Diretor Geral, a quem ficam subordinadas as administrações e agencias, e será estabelecida na principal estação do Correio da Corte”.

Mais adiante, o Art. 5º do Capítulo II descreve a nova estrutura organizacional:

A Diretoria Geral dos Correios é dividida em cinco Secções:

  • 1º Secção central, sob a imediata direção do Diretor Geral;
  • 2º Primeira Secção, da contabilidade;
  • 3º Segunda Secção, da tesouraria;
  • 4º Terceira Secção, da expedição das malas;
  • 5º Quarta Secção, do recebimento e da distribuição da correspondência”.

É provável que essas mudanças tenham influenciado os modelos de carimbos utilizados pelo Correio Central. De fato, a partir de 1867 começam a aparecer diversos novos tipos, inclusive os carimbos franceses, cujo desenho foi utilizado pela primeira vez em âmbito nacional. Todos com legenda “Rio de Janeiro”. Mas isso é já uma outra história.


Notas:

  1. Decreto 399 de 21 de dezembro de 1844, com novo regulamento Federal
  2. Decreto 637 de 27 de setembro de 1849, com regulamento interno da Corte
  3. Decreto 1694 de 22 de dezembro de 1855, com regulamento interno da Corte
  4. Decreto 2748 de 16 de fevereiro de 1861, sobre nova Secretaria Imperial
  5. Decreto 3443 de 12 de abril de 1865, com novo regulamento Federal

Referências:

Coleção de Leis do Império do Brasil – Imprensa Nacional 1822-1889
Catálogo de Carimbos Brasil – Império, Paulo Ayres – SPB 1937
Os correios e telégrafos no Brasil, Margareth da S. Pereira – EBCT 1999
Catálogo de Carimbos Brasil – Império, Paulo Ayres – SPB 1937
História dos Correios, site www.agenciaspostais.com.br
Carimbologia, site www.agenciaspostais.com.br

 * Paulo Novaes é filatelista e editor do site agenciaspostais.com.br

Nota do Autor: a primeira versão deste estudo foi publicada em 2017 na Revista FEBRAF Ano III n°5.

 

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